null Como identificar e superar o stress laboral e o efeito de ‘burnout’

Como identificar e superar o stress laboral e o efeito de ‘burnout’

O stress laboral é uma das grandes epidemias do momento e a síndrome de desgaste profissional, também conhecida pelo termo anglo-saxónico burnout, afeta principalmente as profissões de cariz assistencial. Cabe às empresas e às instituições fazer a sua parte para reduzir o seu impacto, mas quem sofre também deverá também saber lidar com estas situações, o que torna essencial conhecer os sintomas.

Isabel Aranda, psicóloga, coach e especialista em psicologia do trabalho e das organizações, e Elisa Sánchez, psicóloga, consultora e formadora especializada em recursos humanos e saúde ocupacional, vão ajudar-nos a perceber o que é o stress no trabalho e qual o seu impacto na nossa saúde profissional e pessoal. Da mesma forma, ficaremos a saber diferenciar o stress do trabalho da síndrome de burnout, tanto nos sintomas quanto no processo posterior de recuperação.

Definições do stress laboral

Embora possa parecer um assunto banal, na verdade, não o é, mesmo que exista ainda muito a tendência para banalizar o stress no trabalho. De acordo com os dados divulgados pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound), o stress representa 28% dos problemas de saúde relacionados com o local de trabalho e é a segunda causa direta de incapacidade temporária na União Europeia, ficando apenas atrás dos distúrbios musculoesqueléticos.

Diferentes organizações e instituições têm sua própria definição de stress no trabalho, enfatizando aspetos relevantes de nossa saúde:

  • A Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) coincidem em considerar o stress como um dos principais desafios do século XXI, do ponto de vista profissional e laboral. Afeta aqueles que padecem de stress, o clima, a produtividade e a competitividade das organizações para as quais trabalham.
  • De facto, a OIT define o stress ocupacional como "uma doença perigosa para as economias industrializadas e em desenvolvimento, que prejudica a produção, afetando a saúde física e mental dos trabalhadores".
  • Para a Comissão Britânica de Saúde e Segurança, por exemplo, o stress é a reação das pessoas a pressões excessivas.
  • O National Institute for Occupational Safety and Health, nos EUA, descreve-o como o conjunto de respostas nocivas, físicas e emocionais que ocorrem quando a exigência do trabalho não corresponde às capacidades, recursos ou necessidades do trabalhador.

Diferenças entre o stress e o síndrome de burnout

Além do compromisso dos governos e das empresas com a prevenção, cuidados e monitorização dos riscos psicossociais derivados do trabalho - como o stress laboral -, os psicólogos clínicos insistem em enfatizar outra ideia. A verdade é que há um componente subjetivo quando se trata de desenvolver o stress crónico, o que explica por que algumas pessoas são mais vulneráveis do que outras.

Por outras palavras, há situações particularmente exigentes que afetam todas as pessoas em maior ou menor extensão. Alguns exemplos desses casos traduzem-se em situações em que temos que lidar com uma crise inesperada, em que há muito pouco tempo para entregar um projeto importante, ou em que temos metade dos trabalhadores de um departamento de baixa, devido a uma gripe, na altura mais complicada do ano.

A menos que o ambiente de trabalho seja francamente hostil, a maioria regressa ao normal quando a tempestade passar. No entanto, existem aqueles que vivem estas fases com grande intensidade. Essas pessoas não conseguem recuperar e acabam por acumular tensão, sentindo que não dispõem de recursos, tempo e energia para enfrentar as exigências contínuas do trabalho. Se não tomarmos as medidas adequadas perante estes sintomas, o stress torna-se crónico.

O burnout, ou “síndrome do queimado”, é mais complexo e devastador do que o stress laboral. "É típico de profissionais de saúde, de professores e de assistentes sociais, por exemplo. E também ocorre quando há pressão intensa, mesmo partindo de outras pessoas no local de trabalho. O burnout está mais ligado às relações pessoais no trabalho do que ao trabalho em si.” É desta forma que Isabel Aranda, psicóloga, coach e especialista em psicologia do trabalho e das organizações, explica as diferenças entre a síndrome de burnout e o stress no trabalho.

Deste modo, o burnout é uma resposta prolongada ao stress, mas com um componente emocional e interpessoal particularmente intenso. "Nas profissões que implicam assistência e cuidados a terceiros o profissional enfrenta continuamente situações em que a empatia é necessária. A combinação disto com a sobrecarga de trabalho pode fazer um profissional sentir-se sobrecarregado, incapaz de prestar a ajuda que acha que deve prestar. Então, esse profissional acaba por gerar um mecanismo de defesa, que consiste em despersonalizar os destinatários do seu trabalho - estudantes, pacientes, etc. -, tratando-os como simples objetivos, de forma a deter o sofrimento.

Esta estratégia funciona no curto prazo, mas acaba depois por destruir o trabalhador. “Caso se trate de profissionais muito vocacionais, quando se apercebem que já não estão envolvidos e comprometidos com o seu trabalho acabam por ficar com a noção de que tudo perdeu o sentido. Por isso o burnout costuma ser diagnosticado quando já deu lugar à depressão ", afirma Elisa Sánchez, psicóloga, consultora e formadora especializada em recursos humanos e saúde ocupacional. "O trabalho torna-se insuportável - continua Isabel –, o trabalhador não aguenta mais o cansaço físico, mental e emocional e não consegue pensar com clareza”.

“O burnout tem muitas consequências em como o trabalhador se encara a si mesmo: afeta a sua auto-estima, a sua auto-imagem e a sua identidade. Ele sente que não é ninguém e que é inútil, algo que nesse ponto torna muito difícil a tomada de decisões. Ele não está na sua plenitude nem possui as suas capacidades habituais”.

Como detetar a situação a tempo

Enquanto o stress crónico tem como características o envolvimento excessivo nos problemas e a hiperatividade emocional, o efeito de burnout resulta na falta de envolvimento e no entorpecimento emocional. No primeiro caso há fadiga ou falta de energia física, enquanto no segundo a exaustão leva à ausência de energia psíquica.

"O burnout está normalmente mais ligado as exigências emocionais e um sinal de alerta óbvio é o trabalhador não querer saber nada sobre os seus alunos ou os seus pacientes. Quer apenas que eles saiam e que tudo aquilo acabe rapidamente. Deste modo, terá que aceitar que existem coisas que não pode mudar e deverá aprender formas de empatizar sem o contágio emocional. Trata-se de mudar a única coisa que está na sua mão para mudar: a maneira como o trabalhador vive o que acontece com ele próprio e enfrenta o que depende dele", explica Elisa.

Aperceber-se deste problema é co primeiro passo, mas não é possível percorrer o caminho da recuperação sem ajuda profissional. "Uma pessoa com burnout tem que se distanciar da sua situação e entender que o que acontece não é culpa sua. Ela tem que recuperar a sua identidade, já que tende a identificar-se como desagradável, difícil de lidar e muito doloroso o que está a viver com a sua própria pessoa. Este primeiro passo é um grande passo, uma vez que a pessoa se recupera a si própria e começa a perceber que necessita de cuidar de si. E como se consegue isto? Para dar este primeiro passo é geralmente necessária a ajuda de um psicólogo", acrescenta Isabel Aranda.

O psicólogo é também o profissional certo para lidar com o stress crónico. Mas, nesse caso, o processo terapêutico é curto e, em poucas sessões, a pessoa pode aprender a relaxar e a controlar a tensão, através de técnicas simples para pensar e agir de forma mais favorável.

O burnout é mais complexo. "Depois de ter percorrido a primeira etapa - continua Isabel - o segundo passo é recuperar o seu quadro de referências, perguntar o que quer para si e assumir a responsabilidade pelo que acontece consigo. Este compromisso, no entanto, não será suficiente sem dar o terceiro passo, que é agir para que as coisas sejam diferentes. Às vezes, não é necessário mudar de emprego para mudar a sua vida".

Equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal

A aceitação e a mudança de que falam Elisa e Isabel podem devolver a motivação e até mesmo o entusiasmo à esfera profissional daqueles que passaram por um episódio de stress crónico e de esgotamento, mas a realidade é muito mais do que isso. Consequentemente, aqueles que estudam os riscos psicossociais derivados do ambiente de trabalho cunharam um conceito central: o equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal. As empresas e as instituições podem e devem agir como agentes facilitadores, através de políticas de conciliação, flexibilidade, teletrabalho, etc.

No entanto, em última análise, o destino está sempre debaixo do nosso nariz. "Recuperar-se consiste também em aprender a desligar-se do seu trabalho, a cuidar de si mesmo e prestar atenção às outras facetas da sua vida, como cultivar os seus hobbies, partilhar o tempo com as pessoas que ama... Além disso, parece-me muito importante praticar a gratidão: tendemos a concentrar-nos no que nos falta, em vez de agradecer o que temos. Se mudarmos essa perspetiva, começamos a ver que em muitas coisas somos afortunados ", conclui Elisa Sánchez.

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